06 abr Cartilha MPV – Teletrabalho
A Flávio Obino Fº Advogados Associados elaborou Cartilha respondendo as dúvidas mais frequentes encaminhadas pelas empresas referentes a Medida Provisória 1.108/22 no que diz respeito as alterações na regulamentação do teletrabalho.
P – A MPV altera o conceito de teletrabalho previsto na Consolidação das Leis do Trabalho?
R – O art. 75-B da CLT, em sua redação original, estabelece que teletrabalho é a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituem como trabalho externo. A MPV trata teletrabalho e trabalho remoto como sinônimos e dispõe que o teletrabalho não estará descaracterizado pela não preponderância do serviço fora das dependências da empresa. A alteração é apenas conceitual para estabelecer que no trabalho híbrido a prestação de serviços de forma remota estará caracterizada mesmo que não seja preponderante. Assim, o comparecimento do empregado, mesmo que de forma habitual ao estabelecimento, não descaracteriza o regime de teletrabalho ou trabalho remoto.
P – O regime de teletrabalho ou trabalho remoto se confunde ou se equipara à ocupação de operador de telemarketing ou de teleatendimento?
R – O regime de teletrabalho nunca se confundiu ou foi equiparado ao de telemarketing ou de teleatendimento. A MPV inclui parágrafo quarto ao art. 75-B com regra expressa neste sentido.
P – Os empregados em regime de teletrabalho permanecem excluídos do regime da CLT que prevê jornadas de trabalho, períodos de intervalo e descanso, e pagamento de horas extras?
R – O inciso III do art. 62 da CLT era expresso neste sentido. Assim, os empregados em teletrabalho não estavam, em regra geral, submetidos a controle horário. As partes, de outra banda, poderiam estabelecer jornada fixa e o seu controle. A MPV altera o inciso III para dispor que somente os empregados em regime de teletrabalho que prestam serviço por produção ou tarefa estão excluídos do Capítulo sobre duração do trabalho. Desta forma, todos os demais empregados estarão sujeitos ao controle horário e terão que cumprir jornadas rígidas e intervalos, sendo devido o pagamento de horas extras prestadas além do horário contratado.
P – Como pode ser feito este controle de jornada à distância?
R – A Portaria 671/21 autoriza o controle de jornada através do REP-P (Registrador Eletrônico de Ponto por Programa), ou seja, a partir de um software que esteja adequado às exigências previstas na portaria. O aplicativo de controle poderá ser instalado em um computador, em um site na web ou mesmo no celular. Outra alternativa de controle é através de acesso ao próprio sistema de comunicação de dados da empresa, por meio de login e senha, onde fica registrado o tempo “logado” com data e horário de início, intervalos e término da atividade.
P – O controle de jornada também alcança empresas e empregados que tenham estabelecido em acordo ou convenção coletiva de trabalho que o teletrabalho não terá controle horário e não gerará o pagamento de horas extras?
R – O art. 611-A da CLT estabelece que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando dispuserem a respeito de teletrabalho. Assim, as normas categoriais que excluem o controle de jornada e o pagamento de horas extras aos empregados em teletrabalho prevalecem sobre a regra prevista na MPV. Mesmo na vigência da MPV novos ajustes coletivos poderão dispor a respeito, excluindo o controle horário.
P – Existe alguma forma de ser flexibilizada a obrigação de controle de jornada?
R – O art. 611-A da CLT também permite que as partes estabeleçam em negociação coletiva de trabalho o registro de horário por exceção. Assim, nesta hipótese, mantida a obrigação de controle, o registro somente será feito quando o empregado trabalhar horas a menos do que as contratadas ou em serviço extraordinário.
P – A exclusão do controle horário dos empregados que trabalham por tarefa ou produção não pode levar a abusos por parte do empregador?
R – Antes da edição da MPV todos os empregados em teletrabalho estavam excluídos do sistema de controle de jornada, inclusive os contratados por tarefa ou produção. Em relação a estes trabalhadores nada mudou e não se tem registro de abusos neste período de mais de quatro anos em que a regra prevaleceu.
P – Como a MP estabelece como regra geral o controle horário, o tempo de uso dos equipamentos é computado na jornada de trabalho?
R – Os equipamentos tecnológicos e as ferramentas de acesso são próprias do teletrabalho e utilizadas de forma permanente para a prestação de serviços. A MPV inclui um parágrafo quinto ao art. 75-B que parte de uma dissociação entre o trabalho e sua entrega ao empregador, que na prática não existe. De toda a forma, estabelece que o tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho. A redação não é das mais felizes, mas indica que o tempo gasto para transmissão de dados para o empregador fora da jornada normal não é computado como trabalho extraordinário.
P – O que foi regulamentado no novo parágrafo nono do art.75-B?
R – O dispositivo estabelece que acordo individual poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais. Mais uma vez a redação não é feliz. Aparentemente o dispositivo guarda relação com o que denominamos etiqueta digital e direito a desconexão. As partes poderão estabelecer horários de cobrança de serviços e de entrega dos mesmos fora da jornada normal de trabalho, desde que respeitados os repousos legais (descanso semanal, intervalos, etc.).
P – Aos empregados em teletrabalho aplicam-se que normas coletivas? Como funciona o enquadramento sindical?
R – A regra geral no trabalho presencial é de que o enquadramento sindical respeita o local da prestação de serviços pelo empregado, independentemente do município da sua contratação ou da filial a que está vinculado. Assim, a norma coletiva aplicada é a do município da prestação de serviços. A MPV cria uma regra diversa para o empregado em teletrabalho, estabelecendo que são aplicadas as disposições previstas na legislação local e nas convenções e acordos coletivos de trabalho relativas à base territorial do estabelecimento de lotação do empregado. Não restam dúvidas de que é necessária uma regra específica de enquadramento sindical para os empregados em teletrabalho. A disposição da MPV, mesmo que não faça referência a empregados em teletrabalho exclusivo, deve ser lida com este alcance. Se parte do trabalho é prestado presencialmente o enquadramento sindical seguirá a regra geral do local da prestação de serviços presenciais. Quanto aos empregados em regime de teletrabalho exclusivo, o melhor seria a vinculação, para fins de enquadramento sindical, ao estabelecimento da empresa a que o empregado estiver organicamente relacionado (local que recebe, por meios de comunicação de dados, o serviço prestado). A MPV, contudo, estabelece que o enquadramento sindical é vinculado ao estabelecimento de lotação do empregado pela empresa (não se confunde com o estabelecimento de contratação). Assim, o acordo e a convenção coletiva de trabalho a serem aplicados são os do município de lotação do empregado. A nova regra permite a criação de “paraísos trabalhistas”, podendo o empregador, discricionariamente, lotar o empregado em teletrabalho em estabelecimento vinculado a ajuste coletivo mais favorável à empresa.
P – Empresa e empregado poderão ajustar que o trabalho será prestado de forma remota do exterior? Que normas são aplicadas neste caso?
R – Importante destacar, inicialmente, que estrangeiro somente pode trabalhar em determinado país caso tenha visto de trabalho ou autorização especial. Mesmo em trabalho remoto a prestação de trabalho remunerada será irregular por estrangeiro com visto de turista ou de estudante. Diversos países, durante a pandemia, flexibilizaram normas para permitir o trabalho remoto pelos chamados nômades digitais. Feita esta consideração inicial, cumpre destacar que em 1985 o TST adotou a Súmula 207 que estabelecia, com base no Código de Bustamente de 1928 (Convenção de Havana), que a relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviços e não por aquelas do local da contratação. Em paralelo já vigorava a Lei 7.064/82 (conhecida como Lei Mendes Júnior) dirigida especificamente para empresas de engenharia. Com o passar do tempo a Justiça do Trabalho passou a aplicar a lei especial para todos os setores e não só para as empresas de engenharia o que culminou com alteração legislativa em 2009 estendendo as regras para todas as atividades, restando cancelada a súmula do TST. A indigitada lei garante além da legislação do local da execução dos serviços, a aplicação dos direitos nela previstos (adicional de transferência, custeio do retorno, seguro de vida e acidentes pessoais, serviços gratuitos de assistência médica e social, férias anuais no Brasil com custos pagos pela empresa e extensivo ao cônjuge e dependentes, etc.), e da lei brasileira quando mais favorável. A MPV afasta a aplicação da lei vigente no país da prestação de serviços e as regras da Lei 7.064/82 , estabelecendo que ao contrato de trabalho do empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional, aplica-se a legislação geral brasileira, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.
P – É permitido a adoção do regime de teletrabalho ou trabalho remoto para estagiários e aprendizes?
R – A Medida Provisória inclui § 6º no art. 75-B estabelecendo, expressamente, que fica permitida a adoção do regime de teletrabalho ou trabalho remoto para estagiários e aprendizes.
P – As atividades que serão realizadas pelo empregado em teletrabalho deverão constar de forma especificada no contrato de trabalho?
R – A MPV corrige uma imprecisão técnica do art. 75-C que previa que no contrato de trabalho deveriam ser especificadas as atividades a serem realizadas pelo empregado em teletrabalho. A nova redação estabelece apenas que “a prestação de serviços na modalidade de teletrabalho ou trabalho remoto deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho”.
P – Ocorreu alguma alteração com relação as formalidades para alteração da prestação de serviço de presencial para remoto, e de remoto para presencial?
R – Os parágrafos 1º e 2º do art.75-C foram mantidos com suas redações originais. Assim, desde que não exista previsão em contrário em acordo ou convenção coletiva de trabalho, poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual; e poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual.
P – Nestas alterações de remoto para presencial quem suporta as despesas?
R – A MP é expressa ao dispor que o empregador não será responsável pelas despesas resultantes do retorno ao trabalho presencial, na hipótese do empregado optar pela realização do teletrabalho ou trabalho remoto fora da localidade prevista no contrato, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.
P – De quem é a responsabilidade pela aquisição e manutenção dos equipamentos tecnológicos?
R – A MPV não altera a regra contida no art. 75-D da CLT de que as disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito. Estas utilidades não integram a remuneração do empregado.
P – Como as partes podem prevenir doenças e acidentes do trabalho remoto?
R – O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.
P – Existe alguma prioridade entre os trabalhadores para o teletrabalho?
R – A MPV inclui o art. 75-F na CLT que prevê que os empregadores deverão conferir prioridade aos empregados com deficiência e aos empregados e empregadas com filhos ou crianças sob guarda judicial até quatro anos de idade na alocação em vagas para atividades que possam ser efetuadas por meio do teletrabalho ou trabalho remoto.
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