19 fev Como as companhias estão se adaptando para atender a geração Z
Como as companhias estão se adaptando para atender a geração Z
Jovens que nasceram a partir de 1995 já somam 23% da força de trabalho no Brasil. Perfil tem particularidades de engajamento e capacitação.
O aumento no número de pessoas da geração Z entre os trabalhadores brasileiros vem trazendo mudanças na forma de fazer gestão de pessoas nas organizações. Esses jovens, nascidos entre 1995 e 2010, já são o segundo maior grupo entre os trabalhadores do país, segundo amostragem feita pelo ManpowerGroup, de serviços de recursos humanos. Ao analisar 107 milhões de profissionais do país, o Total Workforce Index (TWI) chegou a 23% de pessoas dentro da geração Z, à frente da geração X (20%), que são os nascidos entre 1960 e 1979, e dos baby boomers (16%), nascidos entre 1945 e 1959. Ainda em maior quantidade de trabalhadores, mas com uma pequena diferença, está a geração Y ou milênio, que nasceu entre 1980 e 1994, com 25% do total. A TWI, que analisa 60 mercados globalmente, usa como principais fontes de dados as estatísticas de ministérios do trabalho, Banco Mundial, Organização Internacional do Trabalho e Nações Unidas, além de dados internos.
A geração Z, que muito em breve será a maioria, é composta por pessoas que querem ser ouvidas e anseiam se comunicar. Mais do que isso, são profissionais que enxergam a vida com uma lógica de multiplicidade de percursos. “Isso depende um pouco das condições econômicas, mas os mais velhos estudavam, trabalhavam e se aposentavam. Com a geração Z, a linearidade perde força”, afirma Paul Ferreira, pesquisador do tema gestão de pessoas e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV). Isso significa, ele explica, que é uma geração que pode estudar, depois trabalhar, voltar para os estudos, fazer um sabático, ter vários tipos de trabalho em paralelo ou na sequência e talvez até parar por um tempo para dar espaço a um hobby, quando a condição financeira permitir. “Há um pouco essa luta entre uma visão mais sequencial da vida e a lógica de múltiplos caminhos.”
Nesse sentido, engajar a geração Z requer um novo olhar das áreas de recursos humanos. Uma outra pesquisa do ManpowerGroup, do final de 2023, mostrou que quando se fala de engajamento, a prioridade dos empregadores está voltada à geração Z (30%). Esse mesmo tema é prioridade para 17% quando o foco é a geração X e 12%, no caso de baby boomers. Wilma Dal Col, diretora de gestão estratégica de pessoas no ManpowerGroup Brasil, levanta algumas hipóteses. “As organizações conseguem compreender melhor como as gerações mais maduras, como X e baby boomer, se engajam, uma vez que elas estão no mercado de trabalho há mais tempo, e essa relação corporativa já ensinou a ambos, profissionais e organização, como tornar essa troca mais produtiva para os dois lados”, comenta. “Ao passo que as gerações mais jovens, especialmente a Z, parecem ter como expectativa e aspiração profissional aspectos que o ‘mundo corporativo’ ainda busca aprender e compreender melhor.”
Dal Col pontua que, para os líderes, ainda é um momento de aprendizagem lidar com quatro gerações atuando conjuntamente.
Para aprender a lidar com as diferenças entre as gerações, a Porto criou, em 2021, um grupo que trabalha justamente o tema da intergeracionalidade. A partir disso, a companhia entendeu que, para manter os jovens engajados, é preciso dar sentido, significado e principalmente escolha para esses profissionais – seguindo a lógica dos múltiplos caminhos mencionada por Ferreira. “Isso faz diferença para a permanência dos jovens”, afirma Carolina Zwarg, diretora de gente e cultura da Porto.
De forma prática, essa possibilidade de escolha se dá por meio de promoções – 30% das vagas são fechadas internamente -, mas não só. Os trainees, por exemplo, têm uma trilha de desenvolvimento pré-estabelecida pela companhia e, além dela, uma verba financeira para formações extras que queiram fazer, em uma escolha alinhada com a liderança direta. “O jovem escolhe o seu desenvolvimento e como quer aprofundar o conhecimento”, explica Zwarg.
Os funcionários da companhia, cerca de 12.300, também podem transitar entre áreas, escolhendo oportunidades internas em diferentes segmentos. Um programa de desenvolvimento em tecnologia, por exemplo, permite ao funcionário se capacitar e migrar para essa área. “Ele se desenvolve e se movimenta dentro de casa”, diz. No atual quadro da Porto, a geração Y é maioria (55%), seguida pela Z (23%), X (21%) e baby boomers (menos de 1%).
No Load, que é o hub de educação para funcionários da Porto, o slogan, diz Zwarg, é “múltiplos caminhos de aprendizagem”. “Quanto mais você travar a geração Z, menos ela vai querer continuar na organização.”
Na Sankhy a, desenvolvedora de software de gestão com cerca de 2 mil funcionários, permitir que um empregado tenha várias carreiras dentro da empresa também é uma estratégia para reter os mais jovens. “Entendemos que a carreira é o conjunto de experiências [que o funcionário pode ter] e puxamos o protagonismo para as pessoas escolherem”, afirma Mariá Menezes Boaventura, diretora de pessoas e cultura na Sankhya Gestão de Negócios. Nesse sentido, além de exercer a sua função, o funcionário pode ter vivências diferentes participando de grupos como o “Embaixadores da Cultura”. Um consultor de atendimento, por exemplo, pode participar da organização de eventos internos. “Ao permitir isso, os jovens se conectam com a empresa”. Hoje, quase 65% do quadro é formado pela geração Y, 20% são da geração Z, 15% da X e 1%, baby boomers.
Além disso, para atender diferentes perfis, a universidade corporativa apresenta o mesmo conteúdo em mais de um formato. Um conteúdo de gestão pode ser aprendido em salas de aula síncronas, em vídeo-aulas assíncronas ou em texto. “São os mesmos conceitos de administração, entregues de formas diferentes”, afirma Boaventura.
“Com a geração Z, a lógica de linearidade [na vida profissional] perde força”
Sobre capacitação, Dal Col diz que a geração Z tem uma necessidade principalmente nas competências comportamentais. “Essa geração necessita de ‘reskilling’ e ‘upskilling’ nas ‘soft skills’, que vêm com a vivência e o amadurecimento na utilização de suas expertises”, diz. “No passado, isso se dava em um compasso linear. Hoje, isso ocorre em um compasso exponencial, por isso é importante facilitar o desenvolvimento das soft skills na geração Z.”
A pesquisa do ManpowerGroup identificou como as principais soft skills para a geração Z no Brasil, segundo os empregadores, aprendizagem ativa e curiosidade; colaboração e trabalho em equipe; e iniciativa. Ferreira, da FGV, comenta, ainda, que as novas gerações tendem a lutar por uma visão meritocrática, “e o mérito não espera necessariamente a idade. Muitas empresas têm os passos de carreira bem definidos e não permitem assumir cargos de liderança antes de certa idade”, diz. “Coabitar esses mundos é difícil.”
De todo modo, mesmo com a geração Z ganhando corpo na força de trabalho, Ferreira diz que hoje, o que ainda prevalece é a coexistência das gerações dentro das empresas. Ao mesmo tempo que o cenário é desafiador, a complementariedade traz oportunidades, afirma.
O professor da FGV recorda o estudo de caso da Gucci que, após passar por desafios de mercado, criou um conselho consultivo com pessoas jovens, de menos de 30 anos, em 2015, para entender como a marca podia atrair novos consumidores, de faixas etárias mais baixas, e ser relevante para esse público. Pouco tempo depois, em 2018, 62% dos US$ 8 bilhões de receita anual da Gucci vieram de pessoas com menos de 35 anos.
A Atlas Eletrodomésticos, uma empresa com 70 anos de história e 1.900 funcionários, incluiu recentemente em seu programa de desenvolvimento de lideranças o tema da intergeracionalidade. Celso Palagi, head de recursos humanos da companhia, diz que a capacitação surgiu a partir de uma provocação do CEO da empresa: como desenvolver o líder para que ele possa gerir, conduzir e desenvolver as novas gerações, tanto a Z como a alfa, que em breve estará no mercado de trabalho. Os alfa são os nascidos a partir de 2010. “O que a gente mais preza nesse programa é a comunicação, para mostrar que precisa ter esse entendimento mútuo [entre as gerações]”, diz Palagi. “[O método de gestão de] comando e controle, por exemplo, funcionou, mas não funciona mais. Da mesma forma, os mais velhos podem contribuir [para apaziguar] o imediatismo da geração mais nova.”
Um estudo interno da Atlas Eletrodomésticos indicou que, em cinco anos, cerca de 10% do quadro de funcionários será da geração alfa, os nascidos a partir de 2010, e a Z será 60%. Hoje, a geração Y é maioria (51%), seguida da Z (34%), X (13%) e baby boomers (1%).
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