15 jan Volume de reclamações contra decisões da Justiça do Trabalho dobra no STF
Volume de reclamações contra decisões da Justiça do Trabalho dobra no STF
Segundo estatísticas do Supremo, no ano de 2024, pela primeira vez, as questões puramente trabalhistas superaram as processuais civis.
O volume de reclamações trabalhistas no Supremo Tribunal Federal (STF) dobrou entre 2022 e 2024. Em 2022, foram apresentadas 2.025 ações desse tipo. No ano seguinte, 2.594 e, em 2024, chegaram a 4.274. Entre 2015 e 2018, o Direito do Trabalho não estava entre os três temas mais levados ao STF pela via da reclamação – processo para denunciar quando outros tribunais não aplicam entendimentos já pacificados pelo STF.
Os dados estão disponíveis no painel Corte Aberta. Segundo as estatísticas do Supremo, no ano de 2024, pela primeira vez, as questões puramente trabalhistas superaram as processuais civis (que também podem tratar de temas trabalhistas, mas voltados apenas a questões de tramitação) nesse tipo de processo. De acordo com especialistas, o volume de ações vem aumentando, principalmente, por queixas relativas à aplicação dos precedentes do STF sobre terceirização.
Até a reforma trabalhista (Lei nº 13.467, 2017), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) seguia o entendimento da Súmula nº 331 a respeito do tema. Ela diferenciava a legalidade da terceirização da atividade-meio e da atividade-fim. No ano de 2018, no entanto, o Supremo fixou tese de repercussão geral, no Tema 725, para determinar a constitucionalidade da terceirização de toda atividade empresarial (RE 958252).
A partir de então, o volume de reclamações levadas ao Supremo vem aumentando gradativamente, conforme explica Fernanda Pimentel, sócia da área Trabalhista e Previdenciária do TozziniFreire. “Esse é um dos motivos que fez com que muitas ações chegassem ao STF, porque não havia violação direta à Constituição nesses casos, mas desrespeito a uma decisão tomada pelo STF que, em teoria, deveria ser aplicada por todas as instâncias”, afirma.
Segundo Renata Olandim, advogada da área trabalhista do Machado Meyer, a maioria dos ministros do Supremo hoje adota um posicionamento amplo do precedente firmado no Tema 725. “A tendência das decisões é de diferenciar se houve prova, no processo, de vício de vontade e de vulnerabilidade do trabalhador. Nesses casos, é mais comum que a decisão seja cassada”, diz. “Sem isso, há inclusive muitos setores com várias decisões nas quais o vínculo é rechaçado, como é o caso de sociedades de advogados ou corretores de imóveis.”
Ao julgar a relação de trabalho entre um médico e um hospital, a 1ª Turma do STF cassou o acórdão da segunda instância que tinha reconhecido o vínculo empregatício. O colegiado seguiu a divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes, para quem a segunda instância, ao reconhecer que havia subordinação que caracteriza o vínculo, desrespeitou os precedentes do Supremo (Rcl 47843).
Em contratos de franquia, o Supremo também tende a rechaçar a existência de vínculo de emprego. Em 2023, o Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-RJ) decidiu que um contrato de franquia tinha sido usado para fraudar a legislação trabalhista, pois haveria relação de emprego. Também sob relatoria de Alexandre de Moraes, a 1ª Turma entendeu que a decisão contrariou o entendimento de que a terceirização é lícita mesmo se abrange a atividade-fim (Rcl 57954).
A terceirização também foi considerada legítima pela 2ª Turma, em um julgamento envolvendo um agente de investimentos. Acompanhando o entendimento do ministro Nunes Marques, o colegiado reconheceu uma tendência do tribunal de “abonar novos modelos de articulação entre o capital e o trabalho, diferentes do tradicional vínculo” (Rcl 53688).
Mesmo os ministros com mais tendência a manter os fundamentos de acórdãos trabalhistas quando constatada a fraude acabam vencidos se as ações são julgadas pelas turmas. Isso aconteceu com um corretor de imóveis cujo vínculo foi chancelado pelo ministro Flávio Dino, em decisão monocrática. Quando o caso chegou à 1ª Turma, prevaleceu a divergência apresentada por Cristiano Zanin, no sentido de que os precedentes do Supremo tinham sido desrespeitados (Rcl 66517).
Para Renata Olandim, as reclamações viraram o terreno em que os ministros podem expandir ou delimitar o alcance das teses de repercussão geral. Ela explica que a Justiça do Trabalho, historicamente, trata o trabalhador como a parte vulnerável e aplica os entendimentos de forma “restritiva”.
“No Supremo, a interpretação é ampliativa. Os ministros já disseram que a tese sobre terceirização vale para diretor que consta no contrato social da empresa e está pedindo vínculo, e para advogados, que também estão nos contratos como pessoas físicas”, afirma ela.
Marcos Fantinato, sócio da área trabalhista do Machado Meyer, chama atenção para o fato de que o TST está se preparando para fazer frente a esse movimento do Supremo em 2025.
Em novembro, o tribunal mudou o rito processual do recurso de revista, prevendo uma nova possibilidade de agravo no caso de descumprimento dos precedentes do tribunal. Hoje, se o tribunal de origem nega o reconhecimento do recurso de revista, é possível interpor agravo de instrumento. A Resolução nº 224, de 2024, também autoriza a apresentação de agravo interno.
Na prática, explica Fantinato, o novo recurso vai funcionar da mesma forma que a reclamação funciona no Supremo, para denunciar descumprimento de precedente. Além disso, o Pleno do TST julgará o Tema 29, para analisar os elementos de distinção no que diz respeito à aplicação do entendimento do STF sobre terceirização (RR 1848300-31.2003.5.09.0011). Ainda não há data para o julgamento.
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