30 abr Depósito recursal por seguro fiança como garantia ao direito recursal em tempos de crise
Depósito recursal por seguro fiança como garantia ao direito recursal em tempos de crise
Dizer que vivemos um momento histórico sem precedentes é cair no lugar comum, contudo, a reflexão sobre o tema se impõe diuturnamente na busca de soluções para empresas que respondem a uma reclamatória trabalhista.
Em meio à política de isolamento social adotada em todo o mundo, inúmeras são as empresas que já sentem o impacto econômico decorrente. Quando falamos do Brasil então, país que já vem enfrentando uma retração significativa na economia desde 2016, a discussão revela contornos ainda mais dramáticos.
Neste cenário, nos cabe buscar alternativas que viabilizem a sobrevivência destas empresas. Para esta tarefa árdua, já nos foram dadas algumas ferramentas na Reforma Trabalhista, introduzida pela Lei 13.467/17.
A referida Lei, que entrou em vigor novembro de 2017, em analogia parcial ao artigo 835, § 2º do CPC, acrescentou o parágrafo 11 ao artigo 899 da CLT. Na prática, isso tornou possível o exercício pleno do direito de recorrer na justiça do trabalho, especialmente para reclamados que não podem arcar com os altos custos dos depósitos recursais.
Assim, dedico-me aqui a falar especialmente do Seguro Garantia Recursal, como possibilidade de substituição do depósito no preparo, sendo a sua utilização, sem dúvida, uma forma de oxigenar o fluxo de caixa das empresas que passam por um momento crítico.
Destaco, contudo, que diante de uma série de discussões judiciais, doutrinárias e políticas sobre a constitucionalidade de dispositivos alterados e incluídos pela Reforma, muitos Juízes e Desembargadores, impulsionados pelo Princípio da Proteção, estão, quando não ignorando, confundindo conceitos e institutos, dadas as exigências para aceitação do seguro garantia.
Sob esse prisma, infelizmente, não tardou o judiciário a obstaculizar a utilização do Seguro Garantia Judicial, criando requisitos até mesmo impossíveis de serem atendidos, considerando a legislação pertinente.
Ao analisar julgados recentes, que estabelecem requisitos para a aceitação do seguro garantia, chama a atenção três fundamentos para a sua rejeição, a saber: 1. necessidade de prazo de validade indeterminado da apólice de seguro garantia; 2. valor de cobertura equivalente ao total arbitrado na condenação com excedente de 30% (trinta por cento) e 3. impossibilidade de fixação de cláusula, com previsão de extinção da garantia por requerimento do tomador.
Em primeiro lugar, em que pesem os limites claros de regulamentação do seguro garantia, estabelecidos pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP, órgão responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro, as apólices se moldaram à previsível resistência do judiciário trabalhista, consignando, geralmente, uma série de condições que garantem o seu cumprimento. Ainda assim, muitas foram as decisões que rejeitaram recursos com esta modalidade de preparo recursal.
Alguns Tribunais Trabalhistas têm ignorado as regras formais do instituto, facilmente esclarecidas na Circular 477/13 da Susep, que dispõe sobre prazos e obrigações.
Foi preciso então que o Tribunal Superior do Trabalho se manifestasse, de modo a pacificar tais discussões, por meio do Ato Conjunto TST.CSJT.CGJT nº 1, de 16 de outubro de 2019. Embora restritivo em alguns aspectos, de maneira geral, ele veio responder a maior parte dos impedimentos suscitados pelas decisões na seara trabalhista.
Com relação ao prazo de validade, o art. 3º, inciso VII do referido Ato, disciplina que o período mínimo de vigência deve ser de 3 (três) anos, contrariando, portanto, o entendimento exarado por muitas Varas e Tribunais Regionais do Trabalho.
No que se refere ao valor da garantia, impor que o valor assegurado na apólice corresponda ao total da condenação, acrescido de 30%, quando este valor supera o teto recursal, igualmente contraria o Ato do TST, aqui no art. 3º, inciso II, que expressamente faz referência aos limites impostos pelo Teto Recursal, anualmente atualizado pelo TST, no termos da Instrução Normativa nº3.
Finalmente, no que se refere a possibilidade de extinção da garantia, por óbvio, estamos diante de uma cláusula formal, que para ser perfectibilizada, pressupõe a inexistência de risco ao resultado útil do processo.
Estes são só alguns exemplos de interpretações absolutamente equivocadas do nosso judiciário, em relação a um instituto previsto em lei e que não tem sido adotado com segurança por empresas que tanto precisam.
O que dizer então sobre a recente decisão do Conselho Nacional de Justiça, que entendeu pela nulidade do artigo 8º, do Ato Conjunto nº1 do TST, que, por sua vez, restringe a substituição de depósitos recursais já efetuados por seguro garantia?
Tal decisão parece ser luz no final do túnel. Mas será que realmente é? Se não é, devemos perseguir essa solução. Ora, estamos diante de uma orientação do Conselho Nacional de Justiça. Se não for possível depositar nesta instituição a confiança necessária na condução de soluções para os que buscam a Justiça, onde mais poderemos encontrar?
Mesmo cientes do papel vigilante que o judiciário deve exercer na utilização das garantias, considerando o mercado efervescente das seguradoras e a necessidade de garantir a efetividade da atuação jurisdicional, não se pode admitir posicionamentos ao arrepio da lei, que acabam por cercear o direito de defesa de empresas que lutam, dentro dos limites legais, para se manter vivas em um momento tão adverso.
Mônica Maahs
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