30 nov O Ativismo Judicial na Justiça do Trabalho
O Ativismo Judicial na Justiça do Trabalho
O “ativismo judicial” é um tema espinhoso, pois envolve a complexa hermenêutica jurídica. O que ocorre é que a crítica ao positivismo e ao juiz como a “boca da lei” tem se prestado a justificar sua atividade legiferante, materializada no ativismo judicial.
Como bem recorda Lênio Streck em recente artigo publicado no sítio eletrônico Consultor Jurídico (disponível em https://www.conjur.com.br/2020-out-22/senso-incomum-amicus-tst-inimicus-demais-permito-me-dizer) não cabe ao juiz, inclusive trabalhista, julgar de acordo com o livre convencimento decorrente de sua convicção pessoal. Os juízes estão adstritos ao livre convencimento motivado, ou seja, devem julgar conforme sua convicção e de acordo com a lei e a prova dos autos.
O ponto nevrálgico é definir a tênue linha que separa a interpretação da atividade legislativa. Infelizmente a banalização dos princípios jurídicos, já catalogados em número superior a cem, tem propiciado o surgimento da figura dos “Juízes Legisladores”, assim qualificados na magistral obra de Mauro Cappelletti.
Trata-se de um grande dilema, que afeta os pilares estruturantes do Estado Democrático de Direito. Ora, o juiz do trabalho carece de legitimidade para criar a fonte do direito. Esta tarefa, com efeito, compete ao poder legislativo, legitimado pelo sufrágio popular.
O problema se acentua quando o magistrado, a partir de interpretações subjetivas da Constituição Federal, julga contra a lei. Infelizmente o controle difuso de constitucionalidade é uma porta aberta para esta situação, que deságua na ilegitimidade. Ora, a admissão de um juiz por concurso público não lhe confere legitimação pra criar leis. Repisa-se, esta legitimação decorre exclusivamente do sufrágio popular, ainda que muitos juízes acreditem numa legitimação divina.
O recente episódio em que a 8ª turma do TRT/4 pediu desculpas pela decisão da magistrada de primeiro grau escancara este imbróglio. No caso concreto, a juíza da 7ª Vara do Trabalho de Porto Alegre arquivou reclamação trabalhista em que a autora não compareceu à audiência inicial nem mesmo justificou sua ausência, determinando que ela pagasse as custas judiciais. A autora não pagou o débito e ajuizou nova reclamatória, o que motivou novo arquivamento fundamentado no § 3º do art. 844 da CLT, com a inequívoca redação conferida pela Lei 13.467/17.
A 8ª turma do TRT/4 reformou tal decisão sob o entendimento de que o dispositivo legal invocado pela juíza seria inconstitucional. Como o Supremo Tribunal Federal ainda não analisou o tema em sede de controle concretado, de fato o flanco está aberto para o controle difuso. Até aí, tudo bem. Como dito acima o nosso sistema jurídico autoriza que juízes e desembargadores declarem a inconstitucionalidade incidental de determinado dispositivo legal. A questão é que essa prerrogativa deve ser exercida com moderação, sob pena do poder judiciário invalidar a vontade do povo manifestada por seu legislador.
Neste caso emblemático, os desembargadores não só reformaram a sentença como, em nome da Justiça do Trabalho, pediram desculpas à trabalhadora reclamante. Evidente que estamos diante de um caso claro de assédio do segundo grau contra uma magistrada de primeiro grau. Está em curso uma nítida tentativa de censurar, constranger e tolher o livre convencimento da juíza, que na hipótese, estava motivado na literalidade da lei.
Enfim, a situação exemplifica um duelo nocivo, motivado pelo ódio e pela intolerância à posição divergente. Não há justificativa para a truculência. Como disse Che, mesmo na luta jamais se deve olvidar a ternura. São litígios como este que desafortunadamente alimentam aqueles que buscam o fim da Justiça do Trabalho.
Eduardo Caringi Raupp
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